Wednesday, March 30, 2005

Calipígio, head over gold

Hoje era dia de artes marciais para o pequeno. O acompanhante oficial estava adoentado, por isso a progenitora profanou o local sagrado da orientalidade com seus pés e hálito de fêmea, bem cedo pela manhã. Entrando no prédio, o semblante do menino adquire ares sérios. Olhar compenetrado, ele é todo concentração. Lábios e testa franzidos colaboram para que a energia não perca o foco.

Começa o aquecimento. É o mascote da turma, uns dez anos mais novo do que qualquer um ali. São precisos porém muito doces os seus movimentos de filhote que brinca com a mais profunda seriedade e reverência. Do corpinho jovem em ritmo acelerado de crescimento emana um brilho suave pois, porque tão novo, reflete a luz com incomensurável pureza. Tudo nele se adelgaça, alonga e expande. Não tem mais os ombros estreitos de criancinha pequena e o prenúncio de músculos peitorais bem desenvolvidos já está lá, numa promessa que garante que será cumprida.

Paro de olhar porque percebo que ele se desconcentra e se desconcerta, mas ao cabo de algum tempo, constatando que estão treinando técnicas de combate, volto a observar e sou premiada com a visão mais emocionante dos últimos meses. Ele faz movimentos de luta com o bastão, girando-o incessantemente em torno do corpo, em posições de ataque e defesa, numa belíssima coreografia. O rosto jovem concentrado, os olhos oblíquos mirando o infinito, gotas de suor orvalhando a pele tenra. Nesse instante, os raios de sol vencem a camada de nuvens e refutam a meteorologia que previa dia nublado, emoldurando a figura séria do pequeno guerreiro Jedi. A luminosidade o envolve e seus cabelos, cada vez mais castanhos, mostram que ainda guardam, e talvez sempre guardarão, laivos de ouro da criança de cabelinhos cor de areia que, sabiamente, brincava com a máxima seriedade, ensinando que nada na vida é mais importante do que levar a sério a nossa própria alegria.

Ele me vê, e quase erra. Retiro-me, emocionada.

E, ao vê-lo voltar para o vestiário ao final da aula, percebo a infinita beleza dos seus glúteos musculosos, torneados como gomos de tangerina sobressaindo-se na calça folgada do quimono.