Friday, September 10, 2004

Papitoco e Flicts

Começando a ler cedo, apaixonei-me por livros ainda pequeninha. Dentre todos, um deixou marcas pelo profundo pesar que causou: Papitoco. Incrivelmente, não está mais à venda em nenhuma livraria virtual e nem mesmo o Google foi capaz de mostrar o lay-out do Papitoco - o programa achou uma escolinha infantil com esse nome, o que não elucida nada. OK, então conto eu.

Papitoco era um garotinho que se sentia muito só. Ele queria um amigo. A historinha conta as tentativas (todas frustradas) do pobre Papitoco: o passarinho precisava voar para longe, então não podia ser seu amigo; o cachorrinho tinha seu instinto primal e mordeu Papitoco, portanto também não podia ser seu amigo; sei-lá-quais outras criaturas apresentaram outras limitações, afetivas, temporais ou temperamentais, numa sucessão aparentemente infinita, e Papitoco concluía, após cada experiência, que aquele ou aquela não podia ser seu amigo. Até que Papitoco olha no espelho (ou no vidro traseiro do carro dos pais, agora não lembro bem) e vê seu reflexo. Descobre, ali, que encontrou um amigo para todas as horas, um amigo que jamais irá abandoná-lo. Fim.

Podem imaginar o meu desespero e tristeza ao terminar a leitura?

Ora, não queria ser amiga de mim mesma. Não queria ficar falando sozinha. Não queria brincar comigo e meus brinquedos. Buscava o outro, opiniões diferentes, idéias diferentes. Mesmo que divergentes. Mesmo que indesejadas.
Papitoco descobriu um amigo em si mesmo. Eu descobri que não queria ser abandonada. Conclusões tão díspares com efeitos tão semelhantes: qual a melhor maneira de não ser abandonado nunca? É fácil. É impossível perder o que não se tem. Decidi ser uma pária social - com todo o sofrimento que isso acarreta, porque nada me parecia tão aterrorizante como a sucessão de frustrações e abandonos enfrentada por Papitoco.

Aí entra o Flicts.

Um par de anos mais tarde, li Flicts na Escolinha de Artes. A cada página, mais e mais identificação, crescendo em progressão geométrica. Flicts, um pária social, como eu! E nada nem ninguém gostava de Flicts. Flicts era profundamente indesejado. Ah, ansiava pelo final! Deveria ser grandioso! Um ato de profunda redenção de Flicts! (e minha também. por óbvio.)

Como o livro termina: "a lua é Flicts".

A LUA?!

Puxa vida, então depois de concluir que ninguém poderia ser meu amigo e que eu estava irremediavelmente só, sozinha, sozinha, o máximo que poderia alcançar de redenção na minha patética existência seria ficar AINDA MAIS longe de todo mundo, AINDA MAIS sozinha, AINDA MAIS isolada? Então é assim que funciona? Quando não nos encaixamos em grupo nenhum o que temos que fazer é ir para longe, longe, muito longe, onde possamos ficar à vontade com nossa estranheza?

NÃO!

Pode tapar o seu nariz aí, colega do lado. Pode olhar atravessado. Pode rir. Ria mesmo, ria às largas, às ganhas. Pode ficar escandalizado, triste, chocado, surpreso, atônito, bestificado, ofendido, irritado, raivoso. Pode ficar magoado, até. Não vou embora. Não vou mais me isolar. Vou ficar aqui, bem ao seu lado, e se você não gostar, paciência. O mundo não foi feito só para os standard human beings. Não sou padrão, não me encaixo em parte alguma, sempre uma estrangeira onde quer que eu vá, uma estranha em minha própria pele.

Eu vivo com isso. Viva com isso você também.

4 Comments:

Blogger Elena said...

Oi! Finalmente encontro alguém que fale sobre o papitoco... nossa, como é difícil, ou melhor impossível encontrar este livro... estou tentando... se eu tiver alguma notícia te aviso, abraços!

7:19 PM  
Anonymous Anonymous said...

O Papitoco deve ser reeditado em agosto/2012. Se você quiser, pode entrar em contato comigo, a autora: premsagaro@yahoo.com.br
Abraços
Martha

1:50 PM  
Anonymous Anonymous said...

Esse livro me trás boas recordações da minha infância, quando meus pais liam repetidas vezes pra mim a noite. Confesso que a estória não me lembrava mais, Até mesmo porque eu deveria ter uns 5 anos na época (início dos anos 80). Lembrava apenas do nome Papitoco, mas nem o Google me ajudava a saber mais sobre essa estória. Tenho vontade de ter novamente esse livro, pois o meu não sei onde se encontra. Entrarei em contato por email.
Carlos

6:45 PM  
Blogger yanmaneee said...

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8:21 AM  

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