Tinha aquela necessidade premente de seduzir. Não para dominar. Para conquistar, para deter, reter. Possuir, nem que fosse um pequeno pedaço diminuto como grão de areia, um momento, uma lembrança, algo que fosse todo seu. Ia espalhando relicários de si mesma no fundo profundo daqueles a quem tocava. Aprendera a língua dos homens e agora os confundia com sua própria gramática, fazendo negócios como o homem que calculava.
Era toda simples, porém distante. Parecia ao alcance da mão - e de fato estava -, mas era tácito que ninguém a tocaria, nem ao menos tentaria - de alguma forma obscura, parecia ser contra as regras. Zanzava despudoradamente, dizendo absurdos e sorrindo. Lia naqueles espelhos d'alma todos os segredos obscuros da alma masculina, segredos que aprendera a decifrar desde muito pequena, acreditando que daquilo poderia depender sua sobrevivência. Tinha, sobretudo, medo, e guardava todo seu cerne no escuro fundo falso do pequeno armário de madeira mofada. Era o seu sarcófago.
Não se demorava muito em lugar algum. Eles sabiam, já na chegada, porque os ventos pareciam nunca parar de brincar nos cabelos dela, e mesmo parada e mesmo quieta, seu semblante e corpo traduziam sempre movimento: contido, reprimido, mas movimento. Tudo nela se mexia, suspirava e resmungava de pressa, querendo ir mais além, descobrir o que havia adiante. Eles sabiam, sim, desde o começo de tudo, e escolhiam não ver. É inerente à condição humana evitar a dor. E sempre havia a possibilidade de que algo mudasse, de que ela ficasse.
Quinze meses após a chegada, depois de diversas previsões equivocadas, o vento subitamente virou. Ela se foi tão inopinadamente como chegara. Partiu em silêncio levando sorriso doce e triste: ninguém tivera coragem de abrir mais do que uma pequena fresta no sarcófago.